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Comércio Exterior - COMEX Transportes

É possível sentir saudades da crise?

a crise mundial deixou saudades?Lendo a pergunta acima muitos podem pensar que a mesma é uma grande loucura. Bem, gostaria de esclarecer que não estou falando da escassez de negócios no comércio internacional, mas de um fato curioso que isso trouxe.

Por conta dessa falta de carga, os armadores visitavam as empresas embarcadoras e consignatárias, literalmente, “de pires na mão”, pedindo por embarques. Bons tempos. Um excelente período de flexibilidade, rapidez e disponibilidade. Quase tudo era possível junto às empresas de navegação. Obvio que os prejuízos bilionários foram os grandes motivadores desses atos de benevolência.

Veio o segundo semestre de 2009, a virada para 2010, e a crise pareceu ter terminado para os armadores. Assim, retrocedeu-se à velha lógica, a mesma empregada no período pré-crise: Tudo bem para os armadores, navios cheios; retorno do sofrimento dos embarcadores e consignatários. Lamentavelmente, isso não deveria ser uma lógica, mas, de fato, é o que parece ser. Na exportação a coisa é mais leve. O crítico é na importação.

Dentre os diversos problemas que os consignatários vêm enfrentando, talvez, os mais gritantes sejam aqueles que envolvem os termos de compromisso e as cauções de contêineres.

Os termos de compromisso que os “clientes” dos armadores são obrigados a assinar é o que mais choca. Alguns, válidos por 01 ano, são verdadeiros contratos, com testemunhas, firmas reconhecidas, eleição de foro mais benéfico aos armadores, ou seja, com toda solenidade. O termo é válido, desde que reafirme o que está no contrato de transporte (Bill of lading). O problema começa quando os limites do B/L são extrapolados. Chegou-se ao cúmulo de impor solidariedade aos despachantes aduaneiros. Outro modelo de termo era um contrato de locação de contêiner.

E a caução de contêiner? Podem chegar até dois mil reais por unidade. Os armadores querem tornar isso praxe e já passam a informação previamente em formato demonstrativo de pagamento. Quando não obrigam a empresa a concordar com o pagamento através do termo de compromisso, bloqueiam a carga até que a consignatária efetue o depósito na conta de seu agente marítimo.  E não basta enviar o comprovante de pagamento, o depósito tem que ser confirmado para que haja a liberação. Ora, caução é dinheiro em conta, é capital de giro sem pagar juros. Façam contas e fluxos.

Quem não adere às regras desse jogo tem seus CE’s-MERCANTES bloqueados e fica impedido de retirar a carga do recinto alfandegado, mesmo depois de desembaraçada pela aduana. Para os armadores, não importa se a carga, o frete e as despesas estiverem quitados, importa se o consignatário está fazendo o que ele impõe.

A verdade é que eles sabem que bloquear a CE equipara-se a reter indevidamente a carga. Sabem, principalmente, que não podem obrigar uma empresa a pagar caução mediante retenção da carga.  Mesmo assim, agem dessa forma.

Os problemas do dia a dia são terríveis também. Por exemplo, se uma correção junto a SRF depender do armador, pode levar mais de 15 dias. Existem empresas que entraram no terceiro período de armazenagem aguardando o armador fazer uma simples correção. A correção é cobrada.

São cargas que ficam esquecidas nos transbordos (quebras de lotes), atrasos na chegada da mercadoria, mudanças constantes de procedimentos burocráticos, dificuldades no atendimento, sistemas desatualizados que causam problemas aos agentes de carga. São muitos problemas mesmo.

Outro dia, um armador decidiu mudar de endereço, em plena sexta-feira (dia útil) e deixou todos a ver navios.

Se, cabe à ANTAQ fiscalizar o funcionamento e a prestação de serviços dos armadores, cabe aos usuários a modificação desse panorama. Em outras palavras, trata-se de saber os seus direitos; “o que exigir”, “como exigir” e “de quem exigir”.

O que não dá para admitir é o desembaraço de uma carga ocorrer mais rápido que o trâmite de liberação junto ao armador.

Por André Seixas – Sócio da OP-MUNDIAL SHIPPING SERVICES (IRO-LOG), especializado em reclamações oriundas do transporte e da movimentação de cargas.

Por Leandro Callegari Coelho

Leandro C. Coelho, Ph.D., é Professor de Logística e Gestão da Cadeia de Suprimentos na Université Laval, Québec, Canadá.

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