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Miragem no fim da linha (ou sem luz no fim do túnel)

* Por J.R. Guzzo, publicado na Revista Veja de 18 de agosto de 2010

O trem-bala (TAV – trem de alta velocidade) tem gerado discussões a favor e contra sua construção, e já foi discutido aqui no site que ele não resolverá os problemas de trânsito nem poderá ser utilizado nos grandes eventos esportivos que o Brasil receberá em poucos anos. O projeto é mal detalhado e os custos são uma incógnita, a ponto de levantar dúvidas quanto a sua viabilidade econômica. O texto abaixo, que foi publicado na revista Veja, de autoria de J. R. Guzzo, oferece mais detalhes e uma visão diferente desta obra.

Luz no fim do túnel ou o fim da linha?Uma das maravilhas que o Brasil tem diante de si neste momento é o trem-bala. Que outro prodígio poderia competir com ele? Como o personagem da canção Funiculì, Funiculà, que promete qualquer coisa para levar a namorada até o alto do Vesúvio pelo funicular que hoje não existe mais, os animadores do trem-bala descrevem os benefícios espantosos que o atual governo acaba de nos dar com mais essa realização. Na canção, nosso herói jura à sua Nanninè que o fogo do vulcão não sai correndo atrás de ninguém. O bondinho sobe ao topo, garante ele, com a rapidez do “vento”. Lá de cima da montanha ela vai ver até a “França”, ou mesmo a “Espanha” – isso para não falar na Ilha Prócida, que fica ali mesmo.

Aqui, já se dá como certo que ninguém precisará levar mais de oitenta minutos para ir do Rio de Janeiro a São Paulo, chispando a 280 quilômetros por hora ao longo dos 500 quilômetros, ou algo assim, do percurso. Com mais 24 minutinhos se chega a Campinas. Entre uma ponta e outra, o trem-bala pode fazer paradas nas cidades de Resende, ou Barra Mansa, ou Volta Redonda, mais Aparecida, São José dos Campos e até Jundiaí. Ainda não dá para saber o custo; a conversa começou nos 33 bilhões de reais e já está nos 40, mas acena-se com dinheiro privado para pagar a fatura, e se faltar o BNDES está aí justamente para essas coisas. No palavrório de palanque, em suma, é a última palavra em matéria de Brasil Grande. E na vida real? O que temos, aí, já é puro uísque paraguaio.

O trem-bala é uma lição perfeita de como governar um país e levar adiante uma campanha eleitoral através da fabricação, divulgação e venda de fantasias – ou, mais exatamente, de como fazer política com a utilização consciente do embuste em estado puro. Trata-se de mercadoria falsificada, logo de cara, porque o mundo oficial apresenta o Trem de Alta Velocidade como uma conquista nunca antes vista neste país; só que não há trem nenhum, de nenhuma velocidade, alta ou de qualquer outro tipo. Não há um metro sequer de trilho no chão. Nem poderia haver, pois não há um projeto de engenharia para a linha. Não se sabe nem mesmo por onde, exatamente, o trem vai passar, ou em que lugares vai parar. Sem isso não dá pra saber quantas e quais propriedades serão desapropriadas. Sem essa informação não se pode calcular quanto será gasto em desapropriações. Sem esse cálculo, enfim, ninguém consegue dizer qual será o custo final da coisa. Mas e daí? Para o governo, isso é tudo miudeza.

O que interessa, a menos de dois meses da eleição, não é o trem – é a miragem do trem. Já basta: para que falar em alguma obra que existe, coisa sempre difícil de encontrar, se dá para arrumar voto com uma obra que não existe? O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, pelo menos, acha que o truque funciona – tanto que veio a público tempos atrás, apesar das proibições legais, dizer que “o sucesso” do trem-bala se deve à sua candidata Dilma Rousseff e que tinha de dar esse crédito a ela por uma “obrigação moral”. Como é mesmo? Que sucesso? Que trem? Que crédito? Não pode haver crédito se não houve sucesso, e não poderia haver sucesso se não há trem. Ficamos assim, portanto: não existe obra, mas existe uma autora, e devemos estar muito agradecidos a ela. Na feira de Acari se encontra mercadoria mais legítima.

O segundo ato dessa comédia é a conversa fiada sobre o novo patamar do progresso que o Rio de Janeiro e São Paulo viveriam com o trem-bala, e sua necessidade para a Olimpíada de 2010. Todos os países ricos têm esse tipo de trem; como negar ao povo brasileiro o acesso ao mesmo benefício, sobretudo quando está garantido que o Brasil, segundo nos informa o presidente Lula, será a quinta maior economia do mundo em 2016? Essa conversa deveria parar no exato momento em que se constata que milhões de moradores do Rio e de São Paulo gastam duas, três ou mais horas por dia, todos os dias, para ir ao trabalho e voltar para casa, tempo pelo qual não recebem um tostão furado; levantamento da prefeitura de São Paulo mostra que 50% dos paulistanos, e um número ainda maior de cariocas, consomem nesse trajeto entre uma e quatro horas diárias, num sistema de transporte que tem uma das velocidades mais baixas do planeta. Nas áreas metropolitanas do Brasil como um todo, isso lhes custa mais de 90 bilhões de reais por ano em esforço não remunerado. Quanto aos países ricos, o governo parece não ter percebido que só começaram a ter trem-bala depois que ficaram ricos, e não antes.

Mas para que perder tempo com fatos? A farsa compensa muito mais.

* Por JR Guzzo, publicado na Revista Veja de 18 de agosto de 2010. Fonte: http://veja.abril.com.br/blog/augusto-nunes/feira-livre/miragem-na-linha/

Por Leandro Callegari Coelho

Leandro C. Coelho, Ph.D., é Professor de Logística e Gestão da Cadeia de Suprimentos na Université Laval, Québec, Canadá.

13 respostas em “Miragem no fim da linha (ou sem luz no fim do túnel)”

É curioso como qualquer comentário que critique o desgoverno petista é imediatamente considerado "PSDBista". Por que não rebater os argumentos do texto, ao invés de dizer que há um interesse político nele? Nenhuma única linha do texto é mentira, e todos sabemos o quanto Lula e sua marionete Dilma tem feito propaganda desse assunto. À idéia absurda de construir um trem que atropela qualquer critério de prioridade de investimento, soma-se a inexistência sequer de um projeto preliminar. É impossível negar os argumentos do texto, e se eles são uma crítica ao governo atual, não é porque o autor é favorável a este ou aquele candidato. Vamos afastar o viés político e discutir o que interessa: temos um projeto que consumirá bilhões e que está sendo pessimamente conduzido desde o início!

Acho um texto bem PSDBista, adoro este site mais esta publicação fico uma merda. Acho que deveria mudar o rumo do assunto, ninguem aqui é burro de saber que o transporte do estado de São Paulo esta sucateado e isso não é problema do Presidente e sim dos governantes que são responsaveis para tal problema, claro que o governo Federal tbm poderia dar uma força, e isso esta sendo feito. Também não concordo com o formato do Trêm Bala acho que ja que vai ser feito deveria parar em mais cidades e não apenas em 3 mais ja é um começo que o Serra e companhia limitada não é capaz de fazer ou pelomenos não foram.

tomara que as publicações neste site não fique pobre como esta, pois, ele deve ser mais democratico e mostrar assuntos de primeira linha como outros assuntos que ja me ajudaram muito nas pesquisas de estudos.

não estou querendo polemizar mais vamos deixar a politica de lado e sermos mais flexivo a noticias e a materias de grande interesse que este site ja publicou.

sem mais

Diego Rosa

Ronaldo, concordo com você: o governo federal não deve arcar com os custos de uma possível expansão do metrô na cidade de São Paulo. Isso é problema que a cidade criou com o crescimento e falta de planejamento urbano, e deve ser resolvido no âmbito municipal/estadual. TALVEZ com financiamento do governo federal, mas não concordo que todos os contribuintes do país devam pagar por uma obra que beneficiará apenas a cidade de São Paulo. Esse é um ponto, que já foi discutido em outras matérias também.

O Serra e alguns de seus aliados políticos criticam o TAV usando esse argumento, que acho furado.

Mas o ponto de vista do autor desse texto foi outro, que o Lula e a Dilma estão usando o TAV para angariar votos, comemorando uma obra que nem sequer tem projeto detalhado. Nisso o Rodrigo tem razão, não adianta querer confundir dois argumentos diferentes numa mesma discussão.

Coloquei esse texto no site justamente pra fazer pensar nas questões políticas envolvidas. E como já deixei claro em outra oportunidade, o site não defende nenhum partido político e eu não tenho filiação partidária. Fica a critério de cada um defender/criticar os candidatos, sempre com bom senso e argumentos. Critico sempre o modelo de transporte público oferecido na maioria das grandes cidades do país, e também critico o modelo desse TAV. Culpa de diversos governos/governantes.

Como não???? eles criticam o TAV pq querem esse dinheiro no Metrô. O problema de São Paulo é um problema do estado e da cidade… O governo federal pode dar uma "forçinha"….

O TAV vai ligar dois estados é outra obra….Não sou contra o Metrô pelo contrario vai ajudar São Paulo… mas como eu disse isso é um problema do Governo Estudal e da cidade…nao adianta vir com esse papinho de tirar o dinheiro do TAV pra fazer metrô

Não entendi por que estão tratando de transporte urbano aqui? A matéria não fala nada disso, apenas fala que o TAV é uma miragem e que está sendo explorado com fins eleitoreiros.
Concordo com a posição do texto, não resolverá os problemas de transporte interestadual, que nada tem a ver com o metrô urbano.

isso prova que o governo atual do estado de São Paulo e a prefeitura nao fizeram a lição de casa….a obrigação de fornecer um transporte publico de qualidade é deles….é um problema da cidade de São Paulo. Mas quem critica o TAV , nao cuida do que governa, cade o Metrô, cade os onibus em São Paulo, é o presidente que tem que fazer? obvio que não….

cara, colocar coisa da revista veja aqui? sinceramente, achei que o nivel do blog era outro… quer perder credibilidade é replicar as besteiras da veja.

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