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Aumento nos custos chineses e o impacto no fornecimento

Recentemente o New York Times apresentou algumas mudanças interessantes que estão acontecendo nos custos trabalhistas chineses:

Bruce Rockowitz, presidente-executivo da Li & Fung, maior empresa de comércio e fornecimento de bens de consumo chineses para as redes de varejo dos EUA (e do resto do mundo), disse que os custos médios de aquisição de matérias-primas da empresa subiram 15% nos primeiros cinco meses deste ano em comparação com o mesmo período do ano passado. Executivos de outras empresas de bens de consumo têm encontrado aumento semelhante ou maior.

made in china - mudança no custo ChinêsTodo o resto mantido constante, este aumento no “custo China” reduz a vantagem de custo do país sobre os fornecedores americanos ou europeus, que, espera-se, irá reequilibrar o mix entre fornecimento local e estrangeiro. Mas que tipo de impacto podemos esperar deste aumento de custos? Em outras palavras: podemos estimar a magnitude desse reequilíbrio? Se mantivermos tudo o resto constante, a resposta é (de acordo com Obama): Sim, nós podemos! (Yes, we can!) Em um modelo teórico com duas fontes de fornecimento (uma local, outra estrangeira), é possível mostrar que a fração de unidades compradas localmente é (aproximadamente) inversamente proporcional à raiz quadrada da diferença de custo Δc do fornecedor estrangeiro (você sabe que somos muito sérios quando usamos raízes quadradas e letras gregas na mesma frase!). Assim, todo o resto mantido constante, a teoria sugere que

variação anual de fornecimento local ≈ raiz quadrada (1/mudança anual na Δc)

Infelizmente, saber que os preços da China aumentaram 15% não é suficiente para estimar a variação anual Δc. Este último depende de cada tipo de produto: qual é a mudança de custos locais E a diferança relativa dos locais para os estrangeiros. Mas se você soubesse esses números para o seu negócio, você poderia usar a equação.

Para ilustrar, considere este exemplo simples: suponha que a empresa X comprou, no ano passado, a US$ 100 por unidade no mercado local e a US$ 80 por unidade da China. Se este ano, a China aumentar os custos em 15%, para 92 dólares, enquanto todo o resto permanece o mesmo, qual deve ser a estratégia de compras da empresa X para este ano? Todo o resto é igual, a fórmula prevê que o portfólio de terceirização deve ser reajustado em direção ao mercado local: em comparação ao ano passado, a fração de compras no mercado local vai aumentar em raiz quadrada de (1 / (20/8) ) = raiz quadrada de (2,5) = 1,58, o que significa que podemos esperar um aumento de compras no mercado local de 58% em relação ao ano passado!

Por que um aumento de custos de 15% acarreta uma mudança muito maior nas compras locais (58% no exemplo simples)? A razão é que, para grandes volumes de compras, a maioria seria “importada” e apenas “um pouco de flexibilidade” através do mercado local, mais caro. Uma pequena mudança na maioria, reflete-se em seguida em uma mudança proporcionalmente muito maior no mercado local.

Mas lembre-se: este é apenas um modelo acadêmico com foco em certos fatores, especificamente, o modelo considera compras a partir de 2 mercados e há uma boa razão para que eu enfatizasse “todo o resto mantido constante”. Como salienta o artigo do NYT, a maioria das empresas já vende em pelo menos dois mercados, e a China deve ser um deles. Além disso, nem tudo é igual: claramente, se o mercado chinês está destinado a crescer, há muitos outros bons motivos para manter alguns fornecedores ativos por lá: as operações locais se alinham com vendas locais e proporcionam uma “garantia” contra mudanças no câmbio ou na demanda.

Mas além destas ressalvas e limitações, ainda é interessante que o modelo possa fornecer orientações sobre questões importantes.
ps: A propósito, o artigo do NYT também nos dá algumas estatísticas sobre a famosa Li & Fung:

A Li & Fung processa cerca de 4% das importações varejistas americanos da China, em praticamente todos os tipos de bens de consumo, de acordo com analistas de investimento. A única exceção são os eletrônicos, que tendem a ser importados diretamente para os Estados Unidos por outras empresas como a Apple.

 

Baseado no texto “As China’s Workers Get a Raise, Companies Fret: Anticipated impact on Offshoring” de Jan Van Mieghem, publicado no blog The Operations Room. Tradução e adaptação feitas por Leandro Callegari Coelho e autorizadas pelos autores exclusivamente para o Logística Descomplicada.

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Diferentes riscos para cadeias de suprimentos

As coisas não estão melhorando rápido o suficiente para as montadoras de veículos do Japão – especialmente para a Toyota. O CEO da empresa, Akio Toyoda, falou durante uma conferência para a imprensa na semana passada que eles terão que esperar até o final do ano para que a Toyota volte a produzir com a mesma velocidade. A Toyota está em pior situação dentre os demais fabricantes de veículos japoneses principalmente porque uma fração muito maior da sua produção está concentrada no Japão. Enquanto a Nissan produz 28% dos seus 4 milhões de carros fabricados em 2010 no Japão, a Honda 27% (de uma produção global de pouco mais de 3,5 milhões de unidades), a Toyota produz 43% dos seus veículos no Japão (de mais de 7,5 milhões de veículos produzidos em 2010).

O mais interessante da reunião com a imprensa são os detalhes sobre o que causa os problemas (Wall Street Journal, 23/abril/2011):

A Toyota afirma ainda ter dificuldades no suprimento de 150 componentes, muitos deles relativamente simples como produtos químicos, resinas e borracha. A maioria eram fabricados e fornecidos para atender especificações exatas, o que torna difícil comprá-los de outros fornecedores, de acordo com a empresa. Ainda assim, o número caiu muito, pois em meados de março eram aproximadamente 500 itens.

O Vice Presidente Executivo Shinichi Sasaki disse que a Toyota irá conduzir uma revisão do seu sistema centralizado de fornecimento, incluindo uma análise se seria viável usar peças e material mais comumente encontrados, além de uma reavaliação de sua dependência de um único fornecedor no Japão para muitas destas partes.

Mesmo em casos onde pensávamos que tínhamos mais de um fornecedor, aconteceu em mais de uma ocasião que eles compravam subcomponentes de uma mesma firma”, disse o Sr. Sasaki. “Também estamos tentando aumentar o número de fornecedores de fora do Japão, na medida em que descobrimos que temos altíssima dependência de subcomponentes fabricados localmente”.

riscos toyota produção - supply chainOu então, para reescrever estas falas, a Toyota falhou feio ao estimar os riscos que estavam enfrentando.

A Toyota, é claro, é louvada há décadas por seu excelente trabalho com os fornecedores. Esta habilidade geralmente rende ótimos dividendos – talvez o mais famoso tenha sido quando um incêndio destruiu um fornecedor de peças-chave em 1997. Mas o que deu errado desta vez?

Eu vejo alguns fatores diferentes. Uma possibilidade é culpar o crescimento rápido da Toyota na última década. Aliás, esta tem sido a resposta padrão para tudo que deu errado para a Toyota nos últimos anos. Mas eu acho esta resposta um pouco simplista.

Uma afirmação mais razoável é que isto é uma conseqüência inevitável das tendências da indústria automobilística. Durante os últimos 20 anos vimos um crescimento dos principais fornecedores, que desenvolveram muitas habilidades diferentes. Onde antes um fornecedor entregaria uma peça, o superfornecedor de hoje entrega sistemas completos. Isso possibilitou à Toyota (e outras) a trabalhar com um número pequeno de grandes fornecedores, deixando a tarefa de controlar os pequenos fornecedores para os grandes parceiros. Por isso as “indústrias automobilísticas” são hoje chamadas de “montadoras”. Indiscutivelmente, esta era a maneira mais eficiente de gerenciar o fluxo de materiais, na medida em que os carros tornavam-se cada vez mais complexos. Mas isso também deixa as montadoras cegas para as ligações entre os fornecedores quando, como a Toyota descobriu, alguns dos grandes parceiros compartilham um mesmo fornecedor.

Também é válido notar que este problema não é exclusividade da Toyota. Eles foram atingidos com mais força por esta tempestade, mas isso abriu os olhos das outras montadoras. A verdadeira pergunta agora é: o que se pode fazer a este respeito? Minha opinião é que se pode fazer menos do que as montadoras gostariam – pelo menos no curto prazo. Como você pode imaginar, os componentes que estão atrasando a produção não são commodities. Assim, eles estão presos ao destino de seus fornecedores até que consigam redesenhar o componente ou qualificar outro fornecedor. O que desconfio que irá acontecer é que trabalharão em conjunto com seus grandes parceiros para entender melhor o fornecimento de base e garantir que os fornecedores estão bem dispersos geograficamente. Isto é, um fornecedor fabricará um componente chave mas ele terá a capacidade de produzi-lo em várias regiões. Desta forma, um desastre natural ou desequilíbrio político em uma região não fará desmoronar o castelo de cartas. Os fornecedores também estarão dispostos a entrar neste jogo, visto que eles também estão feridos por não terem diversificado antes.

Dito isto, agora existe um problema de coordenação. O sistema todo pára se alguém não diversificar. Alguns fornecedores americanos devem estar amargando um período ruim mesmo tendo toda a produção a milhares de quilômetros do Japão. Por quê? Porque as fábricas da Toyota ou Honda nos EUA não podem funcionar normalmente sem algumas peças complementares vindas do Japão.

Baseado no texto “Layers of supply chain risk” de Martin A. Lariviere, publicado no blog The Operations Room. Tradução e adaptação feitas por Leandro Callegari Coelho e autorizadas pelos autores exclusivamente para o Logística Descomplicada.