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Montadoras enviam ao exterior US$ 5,58 bi: custo Brasil ou lucro Brasil?

A julgar pelos lucros que receberam, as matrizes de diversas montadoras de automóveis não tiveram do que reclamar de suas subsidiárias brasileiras em 2011. Os dados estão fresquinhos, foram divulgados pelo Banco Central na última terça-feira (24): a indústria automotiva no Brasil foi o setor que mais remeteu dinheiro ao exterior no ano passado, à frente até de bancos e empresas de telecomunicações, que ficaram com o segundo e terceiro lugares, respectivamente.

Não se trata de números frívolos: foram os próprios fabricantes de veículos que registraram junto ao BC remessas de lucros e dividendos no total de US$ 5,58 bilhões, o maior valor de todos os tempos, equivalente a 19% de todas as operações desse tipo no ano no Brasil e 36% superior aos US$ 4,1 bilhões de 2010.

Não por acaso, as remessas recordistas de lucros e dividendos das montadoras instaladas no país aumentaram justamente no momento em que as matrizes mais sofrem nos mercados maduros de Europa e América do Norte, e por isso precisam sustentar seus resultados financeiros com o caixa das subsidiárias em países emergentes. O BC não publica a lista de empresas remetentes de dinheiro nem os valores individuais, muito menos as empresas informam qualquer dado sobre o tema, alegando que só divulgam balanços no exterior — mas lá também não se encontram os lucros recebidos de cada subsidiária; e assim tudo fica por isso mesmo.

US$ 5,6 bilhões – foi o valor total remetido às matrizes pelo setor automotivo em 2011, recorde histórico e maior montante em toda a economia do país

0,7% – foi o crescimento da produção de veículos no Brasil em 2011 ante 2010; o total chegou a 3,4 milhões de unidades no ano

36% – foi o crescimento dos valores remetidos ao exterior em 2011 ante 2010, apesar do pífio aumento na produção

US$ 1.647 – foi o valor enviado ao exterior a cada veículo produzido aqui, independentemente de marca, preço local e destino (Brasil ou exportação)

Nada contra o lucro, tudo contra esconder esses números como se fosse coisa ilegal. Não é. Contudo, é no mínimo desconfortável, tendo em vista que as montadoras, em maior ou menor grau, estão alinhadas ao discurso da falta de competitividade brasileira, que torna difícil a vida por aqui, e que por isso precisaria ser compensada com generosos incentivos fiscais e financiamento público de investimentos. Os dividendos remetidos mostram que a vida no Brasil pode ser complicada, mas também pode ser altamente lucrativa.

Conceito aloprado

É fato que existem problemas de competitividade. Por isso mesmo é surpreendente que, em ambiente tão adverso como pintam as montadoras, as remessas de lucros e dividendos tenham aumentado tanto.

Vale destacar que esses resultados foram conseguidos, em sua maioria, com a venda de carros que têm graus de sofisticação e conforto bastante inferiores em comparação com os modelos fabricados nos países de origem das empresas instaladas aqui, porque no Brasil o poder aquisitivo dos consumidores também é menor — ainda que esteja em ascensão. Em tese, são produtos menos rentáveis, que — para piorar — no Brasil recebem uma das maiores cargas tributárias do mundo para competir com a margem de lucro.

Cabe ressaltar, também, que a produção das fábricas brasileiras de veículos avançou muito pouco em 2011, apenas 0,7% sobre 2010 – ou seja, produziu-se quase o mesmo e, ainda assim, foi possível remeter muito mais lucro: US$ 1,5 bilhão a mais do que no exercício anterior.

Portanto, temos no Brasil um caso inusitado, digno de estudos acadêmicos ainda a serem feitos: fabricantes de veículos dizem enfrentar aqui custos altos de toda natureza, fazem produtos considerados de baixa rentabilidade, com alta incidência de impostos, a produção não avança — e, ainda assim, remetem lucros bilionários às matrizes.

Além disso, ainda sobra algum para prometer investimentos combinados que já passam de US$ 26 bilhões nos próximos cinco anos, considerando somente os anúncios feitos até dezembro passado. Só lucros generosos — e financiamentos públicos idem — podem justificar a aplicação de tamanha fortuna para fazer no Brasil novos produtos e aumentar a capacidade de 18 fábricas de carros e nove de caminhões, além da construção de oito novas plantas de automóveis e seis de veículos comerciais pesados, elevando o número total de unidades de produção das atuais 24 para 38, com capacidade para fazer 6,5 milhões de unidades por ano a partir de 2015.

Por mais aloprado que o conceito pareça, é preciso reconhecer que “Custo Brasil” e “Lucro Brasil” são como irmãos siameses: andam grudados, um puxando o outro, mas sempre na mesma direção: para cima, no preço dos carros, relativamente altos em relação ao que oferecem.

Bom exemplo

O Brasil tem, sim, problemas de competitividade a enfrentar, mas por certo o lucro não está entre eles. Portanto, não há nenhuma justificativa para aumentá-los por meio das medidas de incentivo ao setor automotivo nacional (ou seria transnacional?), que estão em gestação no governo e podem ser anunciadas em fevereiro.

Muito pelo contrário: assim como o país deveria reduzir impostos sobre veículos, as montadoras deveriam dar o bom exemplo de diminuir lucros e incluir mais qualidade tecnológica nos modelos produzidos aqui.

Por Pedro Kutney: jornalista que publicou este artigo em Automotive Business

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Entenda o Lucro Brasil e o Custo Brasil dos automóveis

Nos últimos dias, houve discussão e revolta em razão dos preços dos carros brasileiros em comparação ao exterior, principalmente de modelos semelhantes vendidos no México. Claro que a crítica mais fácil aponta para a ganância e o lucro fácil em nossas terras. No entanto, se deve exercitar um pouco de aritmética e procurar entender que a ineficiência de fatores produtivos em uma economia inclui implícitos como burocracia, cipoal legislativo, impostos invisíveis e corrupção.

entenda o lucro ou custo brasil automóveisAtentando apenas ao explícito, o Brasil se tornou um país caro com a política cambial que valoriza o real frente ao dólar. Qualquer um que viaje ao exterior sabe que do tênis ao quepe o preço é metade daqui. O real forte tem o grande mérito de escancarar as ineficiências brasileiras, ao contrário do passado de moeda fraca. Ao mesmo tempo o câmbio promove fortes distorções comparativas.

Indo mais longe, com ajuda da aritmética e do preço de um sanduíche: um automóvel compacto nos EUA custa 3.000 Big Macs; aqui, 1.500 Big Macs. Pode eleger o culpado que achar melhor entre o sanduíche muito caro ou o carro muito barato. Em 2003, um Fiat Mille custava US$ 4.821 e hoje, US$ 14.465. Para sorte do comprador, pagará em reais 54% mais (abaixo da inflação acumulada em oito anos). Já o preço em dólar triplicou, o que explica a dificuldade de exportar.

Mais importante, não dá para discutir o lucro sem saber o custo. Estudo mais recente da consultoria PriceWaterhouseCoopers, encomendada pela Anfavea, tomou a China como o país de referência. No México, o custo total de produção é 20% maior e no Brasil nada menos de 60%. Dessa forma, o País precisa acordar, pois fica difícil competir frente a esse abismo.

Para comparar preços em dólares no mercado doméstico mexicano é preciso cuidado. As vendas de veículos novos estão atrofiadas (apenas 800.000 unidades/ano, 80% menos que o Brasil) pela concorrência predatória de carros seminovos e usados dos Estados Unidos, mercado gigantesco e de impostos baixíssimos. O preço do usado segura o do novo, à custa de empregos na indústria. O próprio México tem carga fiscal bastante inferior, bem como todos os países vizinhos do Brasil. Para agravar, nos últimos cinco anos o real se valorizou 29% e o peso mexicano caiu 16%, ambos frente ao dólar.

MERCADOS DIFERENTES
Interessante como ninguém teve a ideia de confrontar com a Europa. Vende-se o Fox paranaense na Suíça, em francos, pelo equivalente a R$ 28.000 (sem rentabilidade, segundo a VW) contra R$ 38.000 aqui, no mesmo nível de equipamentos. A diferença é a carga fiscal, porém a tese aloprada do Lucro Brasil só permite exemplos do México ou da Argentina.

Por falar no país “hermano”, os compradores argentinos ganharam um bem humorado apelido nos tempos em que o Brasil fazia maxidesvalorizações de sua moeda. Eram os “Da-me dos” (“Levo dois”, em português), pois entravam nas lojas e de tão barato levavam duas unidades de tudo. Que pena não podermos ir ao México comprar dois carros pelo preço de um e exportar para o Brasil sem ônus fiscal.

Em resumo, com impostos e ineficiências brasileiras, temos o carro mais caro do mundo; com carga tributária justa e sem o Custo Brasil, a história seria outra.

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Por  Fernando Calmon: engenheiro, é jornalista especializado no setor automobilístico desde 1967, quando produziu e apresentou o programa “Grand Prix” na TV Tupi, no ar até 1980. Dirigiu a revista AutoEsporte por 12 anos e foi editor de automóveis das revistas O Cruzeiro e Manchete. Entre 1985 e 1994, produziu e apresentou o programa “Primeira Fila” em cinco redes de TV. A coluna Alta Roda, criada em 1999, é publicada semanalmente — na internet, é exclusiva de UOL Carros. Calmon também atua como consultor em assuntos técnicos e de mercado na área automobilística, e como correspondente para o Mercosul do site inglês just-auto.

Fonte: UOL Carros