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Vai faltar combustível, carros não!

A logística de combustíveis no País inicia sua passagem pelo olho do furacão. Há muito tempo não se destaca tantos gargalos envolvendo esse mercado. O fator preponderante é, mais uma vez, a deficiência da infra-estrutura no Brasil. Com uma visão estritamente comercial de apenas vender e vender, arrecadar e arrecadar, deixando de lado a importância do planejamento, dos estudos de capacitação e da sustentabilidade necessária para cada mercado, os brasileiros amargam a iminência de filas em postos de combustíveis, da exploração e até a convivência com o fantasma do desabastecimento. Vamos entender como isso já faz parte da nossa realidade:

Num artigo anterior, destaquei o mercado de automóveis com suas pressões por vendas e com sua isenção sobre a suportabilidade da nossa estrutura atual ao comportar milhares de veículos despejados diariamente em todos os estados brasileiros. A indústria sustenta que ainda temos muito espaço para a motorização no Brasil. Nos Estados Unidos a proporção de veículos é de um para cada pessoa; no Japão é de um para duas pessoas; enquanto no Brasil é de um para seis pessoas. Não podemos deixar de observar que as condições estruturais e de suprimentos são bem diferentes. A prova de que para cada ação há uma reação, não poupa esse assunto tão importante para todas as economias. Principalmente quando não se respeita uma lógica natural de que para mais carros, mais combustível.

Acontece que o Parque Industrial da Petrobras já não atende nossas necessidades há anos. A história que nos chegou em 2006 de que nos tornamos auto-suficientes em petróleo não foi bem explicada à maioria dos brasileiros nem vivida de forma vantajosa, exceto politicamente, por aqueles que tomam as decisões importantes para o País. Essa auto-suficiência implica no petróleo pesado que tem um custo maior para refino já que nossas refinarias são preparadas para o refino do petróleo leve do qual se extrai produtos nobres com um custo bem menor. Continuamos dependentes das importações para irmos ao trabalho, pegar nossos filhos no colégio e nos deslocarmos para o lazer que cada um gosta e tem direito.

Sob essa membrana de interesses, os brasileiros se tornam, para variar, reféns de estratégias errôneas e embarcam na onda do carro próprio sem imaginar que esse ato não envolve apenas sua decisão de adquirir um bem tão necessário. Deixemos a questão da infra-estrutura de trânsito com suas rodovias precárias e insuficientes um pouco de lado para entendermos melhor o que nos espera na questão do abastecimento do nosso combustível de cada dia.

Enquanto a população brasileira cresceu 12% na última década, a frota de carros leves cresceu quase 64%. O Brasil, nesses últimos anos, descobriu reservas gigantescas de petróleo, mas os investimentos não contemplaram nossa capacidade de refino. A preocupação foi mais em dividir o “bolo” entre os estados do que se preparar para a extração. Infelizmente, teremos que provar dos transtornos de um desabastecimento para que haja uma reação; como foi com a questão da energia elétrica com seus apagões e racionamentos.

Para suprir o mercado de combustíveis o Governo vem bancando importações com custos altíssimos pela nossa deficiência portuária. Esse combustível vem em navios-tanque que, em média, aguardam até quatro dias nas chamadas janelas de atracação. Em alguns portos brasileiros esse tempo é dobrado e ainda a maioria desse portos não possui calado (profundidade) suficiente para aportar navios de maior porte, os que possuem passam por maiores dificuldades devido seus gargalos. Se juntarmos a deficiência portuária do nosso País que não atende, nem de longe, nossas necessidades inviabilizando qualquer operação que prime por agilidade na descarga e no escoamento com uma política de visão curta e desinteressada, o resultado é perigoso.

Na contramão disso, o Governo vem agradando as montadoras com as reduções dos impostos a fim de favorecer o escoamento dos estoques e incentivar a produção. Até aqui, tudo bem! A garantia do emprego dos brasileiros é prioridade para a economia. Mas ele, o Governo, peca na falta de investimentos adequados para ampliação e modernização dos parques de refino para ter como abastecer esses carros futuramente. O último investimento, ainda não consolidado, de cerca de 3,2 bi na refinaria (RLAM) em São Francisco do Conde, na Bahia, não ameniza o desgaste de seis décadas de atendimento precário. Mais uma vez estamos calçando a meia sobre o sapato.

Nessa escalada de consumo temos um sério problema para manter essa frota de carros e caminhões abastecidos. Na tentativa de reduzir os custos operacionais da Petrobras, as outras distribuidoras são prejudicadas com reduções de seus estoques. Dessa forma, o abastecimento nos postos de combustíveis fica comprometido já que se aumenta a demanda e diminui-se o estoque. Os postos bandeira (aqueles que possuem a marca de uma distribuidora) ficam em situação difícil já que a disponibilidade não garante o abastecimento em tempo hábil e os postos “bandeira branca” (que não possuem vínculo com distribuidora) não tem acesso ao produto, pois a prioridade contratual é para os postos vinculados.

Em resumo, a indústria automobilística despeja produção aumentando ainda mais a necessidade de combustível, as refinarias não suportam a demanda, o Brasil importa combustível, mas nossos portos atrasam e aumentam os custos do produto, a Petrobras – a única real detentora do poder do abastecimento de derivados no Brasil – corta os estoques destinados às outras distribuidoras para garantir o abastecimento dos postos bandeira BR. Diminuindo a quantidade de postos para atendimento os brasileiros correm o risco de ficar a pé.

E aí surgem outras questões como o desenvolvimento dos carros elétricos onde estamos bem atrasados, o transporte público – que não merece comentários – e o consumo do etanol. Também não temos muito o que esperar dessa indústria – com suas carências e interesses –, uma vez que, com o aumento da demanda de gasolina, o álcool acompanha, pois para misturar o anidro, que hoje representa 20% à gasolina “A” para obter a gasolina “C” que usamos, a produção também deverá ser maior, tirando aqui as possibilidades do domínio do álcool hidratado que usamos nos veículos. Ou se muda essa política ou se resolve investir para valer.

Vou mais longe e afirmo que esse será o tema para as próximas eleições para presidência. Até lá, a maioria dos brasileiros não perceberá essa questão como algo tão prejudicial, pois tudo será tratado sem muito alarde.

Em curto prazo não há uma solução definitiva, e paliativos não vão colocar o Brasil no caminho certo, mas com muito trabalho e investimentos certos podemos reverter essa situação e consolidar nosso crescimento. Por enquanto, estamos limitados por nós mesmos.

Por Marcos Aurélio da Costa

Foi Coordenador de Logística na Têxtil COTECE S.A.; Responsável pela Distribuição Logística Norte/Nordeste da Ipiranga Asfaltos; hoje é Consultor na CAP Logística em Asfaltos e Pavimentos (em SP) que, dentre outras atividades, faz pesquisa mercadológica e mapeamento de demanda no Nordeste para grande empresa do ramo; ministra palestras sobre Logística e Mercado de Trabalho.

7 respostas em “Vai faltar combustível, carros não!”

O Brasil se acha auto suficiente em petróleo realmente porem falta refinarias nós não avançamos em muitas coisas no Brasil a questão do combustivel é apenas uma delas,nosso governo tupiniquim tenta de todas as formas aumentar o PIB do Brasil incentivando as vendas tanto de produtos de linha branca ( geladeiras e fogões) ,e veiculos automotivos ocorreu a baixa da IPI com o intuito de alavancar as vendas e aquecer a econômia porem é uma jogada para fazer o escoamento dos veiculos travados nos pátios de grandes montadoras. O Brasileiro tem na cabeça que carro na rua é sinal de progresso,uma idéia que sinceramente é idiota. teremos problemas com combustiveis? Sim teremos porem existe um outro problema a ser ressaltado os espaços nas vias que estão cada vez mais saturadas isso nos mostra como somos um país sem estrutura e sem planejamento algum.

Agora para os novos caminhões,ficou mais caro com o ambientalismo,a ideia e boa esta no caminho certo,mas infelizmente falto planejamento com o biocombustível.Os caminhões tem que abastecer 2 tipos de biocombustível para ter a queima ou seja a combustão e nem todos os postos estão equipados com o novo combustível que está substituindo o óleo diesel que é o (biodiesel)com essa má distribuição fica dificil abastecer o veiculo e as vezes indo para zonas mais longe para o abastecimento perdendo tempo e combustível ou seja perdendo dinheiro.Alem do biodiesel ser mais caro e render menos por sua combustão ser mais baixa.Isso leva a ter uma grande competição de matéria prima pois a procura e demanda aumenta ocasionando ecasses , concorrendo indiretamente com as industrias alimentícias fazendo com que o custo da produção de alimento fique mais caro,fora os outros gargalos logísticos de falta de infra estrutura como rodoviários,ferrovia,hidrovia,portos,aeroportos,alto custo de transporte etc.Deixando cada vez mais caro os produtos.Todos esses problemas por causa da falta de planejamento e pesquisa.Não e só desenvolver a tecnologia e lançar no mercado,tem que planejar sua produção distribuição e Assistência para poder alimentar o mercado de forma mais pacifica.

Ótima visão Marcos, e concordo com o Ricardo, muitos podem não olhar esse texto com muito interesse, mas com certeza num período bem breve lembraremos do que foi mencionado aqui por você. O nosso país, infelizmente, precisa melhorar e muito com relação a estrutura, em geral.

Marcos, tenho certeza que agora esse texto não será visto com muito interesse por muitos, pois ainda estamos na fase da empolgação. Mas ele será bem lembrado por quem lê-lo no prazo que você menciona. Sou do ramo de combustíveis e essa será nossa realidade. Parabéns pela visão.

É Marcos, bem colocado mais uma vez.

Essa auto-suficiência foi marketing político,
e o aumento contínuo do número de automóveis reflete em
parte a nossa cultura, mas principalmente a falta de bom meios de transportes públicos.

Enquanto isso, sofreremos com preços altos e gasolina batizada com o aval do governo.

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